Heartstopper volta mais madura na 2ª temporada, sem perder sutileza e doçura

Marcos Pitta

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Nova temporada - Netflix já tem todos os episódios da segunda parte de Heartstopper disponíveis. (Foto: Reprodução/Internet)

O adulto de hoje, pertencente à comunidade LGBTQIA +, certamente teve uma infância e adolescência complicadas, seja no ambiente familiar ou escolar. Principalmente na escola. Se aceitar como é, por mais que algumas pessoas consigam fazer isto na adolescência, o ambiente escolar é um dos mais tóxicos e onde muitos traumas são desenvolvidos. Heartstopper, série da Netflix, que estreou sua segunda temporada na quinta-feira (3), é, com certeza, feita para este público. E cumpre sua missão.

A produção liderou o top10 do streaming durante toda a semana, com todos os assinantes sedentos para acompanhar a segunda parte da trajetória de Nick (Kit Connor) e Charlie (Joe Locke).

Toda a construção da narrativa, desde a primeira temporada, é construída com muita delicadeza. Nesta segunda, especificamente, a direção volta ainda mais sutil e mesmo quando os assuntos são tensos para a vida dos personagens, o público consegue sentir a doçura.

Os protagonistas se apaixonam na escola, um assumidamente homossexual, mas que foi exposto de uma forma ruim para toda a escola e sofreu homofobia que o deixou com marcas. O outro, não assumido, descobre-se bissexual e é classificado como padrão pela sociedade e que, dificilmente, alguém o consideraria gay. Como unir estes dois mundos? Através do amor. Nada abala Nick e Charlie, o sentimento desenvolvido entre os dois é tão grande, tão doce e tão bem fundamentado que não há quem consiga destruir. Nem o irmão homofóbico de Nick, nem um amor abusivo do passado de Charlie, nem os amigos preconceituosos.

Para além da escola, o núcleo familiar também é bem explorado na série. Nick tenta, durante toda a segunda temporada, criar coragem para contar ao pai e aos amigos sobre sua sexualidade. Tarefa difícil.

As sequências construídas mostram que, apesar de parecer simples dizer o quanto você ama alguém, na hora H é mais difícil do que qualquer outra coisa. Nick sofre com isto. Não é simples falar e Charlie entende, mesmo com a ansiedade gritando forte dentro de si.

Heartstopper é uma série feliz, mostra o universo de um amor gay com doçura, como muitos adultos de hoje não tiveram o prazer de vivenciar. É bonito ver que isto existe, mesmo na ficção. Outro ponto importante da narrativa é que os personagens conseguem apoio em lugares que nós, hoje adultos, não tivemos na época escolar.

Os professores da escola, por exemplo, são fortalezas quando Nick e Charlie precisam. Na medida certa, claro. Mas são. Os melhores amigos sempre dão apoio, mas nada como você estar sofrendo e ter um professor sabendo da situação e te dizendo, mesmo que indiretamente, que está tudo bem.

No núcleo familiar, é lindo ver a relação da mãe de Nick com ele, assim como é possível se emocionar ao ver como Charlie é tratado pelos pais e pela irmã que o apoiam totalmente. Muitos não tiveram isto em sua adolescência ou no momento da vida em que se descobriram.

Para quem já viu a primeira temporada, é notório o amadurecimento de toda a construção narrativa nesta segunda parte. Vários assuntos ganharam mais notoriedade, sem perder a sutileza. A homofobia, embora esteja presente fortemente no universo e mostrando o quanto é incômoda, divide espaço com relações familiares conturbadas, questões de saúde mental, que são problemas de gente grande com os quais, no nosso mundo real, nem a maturidade é garantia de estabilidade.

O aprofundamento nas relações de outros personagens também é visível. A exploração de outras relações que vão além do casal gay protagonista. É representativo ver a construção iniciada de um dos personagens descobrindo-se assexual. Isto ajuda o público a entender, a doçura pela qual a direção trata cada cena, permitindo ao espectador identifica-se com o personagem.

O lema que mais marca a segunda temporada é que quando duas pessoas se amam, elas não devem esta informação a ninguém. Apesar de Nick lutar consigo mesmo para conseguir assumir-se, a série não trata desta pressão para que você revele a todos quem você é. Não é sobre isso. É sobre entender-se com você mesmo e ser feliz. Heartstopper é uma série feliz, com dilemas reais e pesados, mas tratados de forma leve, doce e sutil. Vale a pena.

Publicado na edição 10.780, sábado a terça-feira, 12 a 15 de agosto de 2023 – Ano 99