Gaudêncio Torquato
Mesmo distante das eleições de 2018, sem saber que nomes entrarão na corrida, é possível fazer uma previsão sobre o discurso eleitoral tendo como ponto de partida: teremos uma polarização entre forças políticas e, nesse caso, um discurso mais vertical, ou a tendência será a de horizontalização e consequente dispersão de mensagens? A resposta aponta para a polarização, sob a visão de que os escândalos em série a que vem sendo submetida a esfera política e, ainda, com a disposição do Partido dos Trabalhadores de não arredar pé do apartheid social que instalou, com sua chegada ao poder, em 2003.
Analisemos os fatores que entrarão na composição do discurso eleitoral. Em primeiro lugar, sobressai a intensa indignação que o petismo-lulismo tem despertado em agrupamentos sociais, a partir do Sudeste do país, notadamente São Paulo, que possui o maior colégio eleitoral, com cerca de 35 milhões de eleitores. Luiz Inácio, o PT e alguns de seus quadros não são bem vistos no território paulista e perderam espaço – inclusive em seu berço, o ABC – na campanha de 2014.
Em segundo lugar, a expressão de Lula nessa fase inicial de pré-campanha é um convite à polarização. Continua ele a denunciar o “golpe” contra sua pupila, Dilma, promete fazer um referendo sobre todos os atos do presidente Michel Temer, a partir da reforma trabalhista, prometendo, se eleito, seguir agenda idêntica ao que realizou em seus dois mandatos. Ou seja, Lula, sob aplausos do PT, diz que governará com a bola do jogo antigo, hoje furada.
Vingará esse discurso? Em algumas regiões, arrebanhará exércitos, como na região Nordeste onde o ex-presidente continua a ser considerado o “Pai dos Pobres”, o “Salvador da Pátria”.
E eventuais acordos que o PT costurar com outros partidos, inclusive com o PMDB de Renan Calheiros em Alagoas? Lula passará por cima disso com tranquilidade. A previsão é a de que fará loas a Renan, tirando-o do bolsão peemedebista que deu “o golpe” na presidente Dilma. O mesmo fará em relação a parceiros de outros Estados. Lula é pragmático. Sabe que sua palavra é sagrada e não será desacreditada pelas massas. Com exceção, claro, de contingentes mais próximos aos grandes centros urbanos, onde há maior acesso à política e consciência sobre os comportamentos dos atores políticos. O palanque será seu escudo contra a Lava Jato.
A competição expressiva terá na outra banda os núcleos da direita, que procurarão enaltecer virtudes e mensagens de seu timoneiro, o deputado Jair Bolsonaro. Que será o contraponto a Lula. Bolsonaro poderá arrebanhar apoios de fortes grupos de classe média, principalmente de áreas mais conservadoras. Encontrará dificuldades, porém, no campo das grandes propostas, eis que é limitado e tem estreito conhecimento sobre o país.
Sabendo que o PT terá dificuldades em refazer seu edifício político, arruinado em parte pelo bombardeio da Lava Jato, Lula quer eleger grande bancada, esperando, para tanto, que a velha militância volte a perfilar em torno de seus afilhados. Ou seja, apenas com os velhos eleitores daria para o PT resgatar a antiga força. E essa militância tende a se inclinar por um discurso radical, azedo, forte. Não é esse o discurso, por exemplo, do PSOL, cujos votos saem de bolsões mais fechados da esquerda? O Rio de Janeiro, nesse particular, é o território psolista por excelência.
Pode haver quebra da polarização? Sem dúvida. É o que esperam os exércitos que se formam no meio do arco ideológico. Que aguardam a entrada no páreo de um perfil de centro, com mensagens densas e concretas sobre os problemas vividos pela Nação. Mesmo assim, não conseguirá atrair todos. A radicalização faz parte do jogo de certas equipes. E razoável parcela de engajados e militantes não abandonou o sonho de voltar a construir castelos ideológicos, em cujas paredes exibirão o estiloso bigode de Stalin.
Colaboração de Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato