Breno Rosostolato
Em um estudo realizado recentemente nos Estados Unidos pelo Centers for Disease Control and Prevention (Centro de Controle de Doenças e Prevenção, em tradução livre) revelou que as mulheres americanas estão esperando mais tempo para terem filhos. A pesquisa apontou que as mulheres entre 30 e 40 tornam-se mães em maior número em comparação com mulheres adolescentes e jovens adultas. Essa constatação acompanha as tendências de outros países como o Canadá, Alemanha e Inglaterra.
Mas o que chama a atenção não é o fato das mulheres terem cada vez mais tardiamente a necessidade de serem mães, embora este já seja o retrato de um reposicionamento das mulheres na sociedade, e sim concomitante ao desejo de se tornar mãe o direito de não assumirem a maternidade. Se a idade avançada em comparação com outros tempos, em que o ideal da maternidade fazia com que muitas mulheres engravidassem novas, já demonstra que não existe pressa para ter um filho, a própria idealização materna parece perder forças e se enfraquece. A figura materna dá lugar à emancipação e autonomia das mulheres.
Esta concepção de que a mulher possui um “extinto” materno é uma ideia construída socialmente, impositiva e aprisionadora. As mulheres se veem na obrigação de cumprir com um acordo entre elas e a natureza. São cobradas, pela sociedade e por outras mulheres, a terem filhos e cumprir com esta determinação, como se fossem inferiores e imorais por não quererem ter filhos. São julgadas como incompletas. Como se quem não tem filhos não tivesse condições e sensibilidade de entender o que só as mulheres com filhos podem. Uma espécie de cultura da vitimização. O mito do “instinto materno” além de estigmatizar, limita e segrega. Instinto, inclusive, que não deve ser entendido como um comportamento inato das mulheres. É perversivo esta atribuição feita às mulheres desde pequenas, de que desenvolvem naturalmente o papel de mãe.
Esta concepção, errônea, de que a mulher atingirá sua maturidade emocional e social sendo mãe é resquício de uma visão diminuída do papel da mulher na sociedade, em que lhe era atribuído a total aceitação ao casamento e a maternagem. Dedicação plena à família e ao marido. Obedientes e submissas, a gravidez garantia à mulher respeito entre as pessoas, uma concepção de santificação por gerar um ser. Ao homem a possibilidade de ter herdeiros e, portanto, a continuidade de seu legado.
No século XIX, por exemplo, para garantir filhos legítimos, o marido obrigava a esposa a ficar o dia inteiro em casa. O gineceu, quarto particular da esposa, no qual ela passava boa parte do dia, era uma prisão domiciliar e permitia ao marido o controle sobre a vida da esposa. Aos homens, mudanças também aconteceram por causa destas nova postura das mulheres quanto à maternidade. Os maridos não cobram a geração de filhos como se fosse obrigação da mulher. Muitos aceitam a vida particular do casal e principalmente, a autonomia de suas esposas. O casamento e as famílias vão se moldando aos tempos atuais e às novas mentalidades.
A grande quebra de paradigmas quanto a ser mãe foram três fatores preponderantes na vida das mulheres. O primeiro deles foi o surgimento da pílula anticoncepcional, o segundo fator foram as mulheres frequentando as universidades e o terceiro a inserção no mercado de trabalho. A pílula garantiu às mulheres igualdade de direitos, uma liberdade que não tinham. Podiam assim evitar a gravidez indesejada e aos poucos desmistificaram o simplório papel de “parideiras”. A intelectualidade e o trabalho produziu nas mulheres uma função importante e essencial. Mudanças culturais significativas. Passaram a produzir através do trabalho. Ações que dignificaram gradativamente a posição das mulheres na sociedade. Descobrem, portanto, que não são relegadas às tarefas domésticas e passam a exigir direitos e igualdades sociais. As mulheres passam a ser remuneradas, com isso, conquistam a independência financeira e o rompimento da dependência aos homens.
Mesmo com o crescimento nas estatísticas de famílias sem filhos elas não superaram as famílias com filhos, constatação do professor Reinaldo Gregori, doutor em demografia pela Universidade da Califórnia, em Berkeley nos Estados Unidos. Ele afirma que este crescimento é uma tendência, principalmente, levando-se em consideração que esta é a escolha de muitos casais jovens.
Esta emancipação das mulheres não é um movimento contra a maternidade. Pelo contrário, é a uma nova maneira de a mulher ser e estar no mundo, se apoderando do livre arbítrio e se posicionando. As mulheres estão dando ênfase ao trabalho, aos estudos, se profissionalizando e se capacitando cada vez mais. São cursos, pós-graduação, mestrado e doutorado. Optam em viajar e conhecer o máximo de lugares que conseguirem, querem dormir noites inteiras e tudo bem.
O que se percebe é que muitas mulheres querem ter filhos, mas não querem ser mães. Adquirem os benefícios da maternidade, mas não assumem o ônus de ser mãe. É uma responsabilidade muito grande ter filhos e muitas mulheres não conseguem assumir este papel. A escolha em não ter filhos não é tão objetivo quanto se imagina e se confirma ao longo da vida. Ter filhos não é tão fácil assim também. O casal deve refletir muito bem antes de serem pais. O importante é que as pessoas devem ser felizes de maneira livre, através de suas escolhas e que filhos não tornam ninguém melhor do que ninguém.
(Colaboração de Breno Rosostolato, professor de psicologia da Faculdade Santa Marcelina – FASM).
Publicado na edição nº 9607, dos dias 8 e 9 de outubro de 2013.