
Estamos vivendo a quarta revolução industrial, cujo cenário dispõe dispositivos físicos se conectando à Internet com o objetivo de coletar dados sem a necessidade de intervenção humana. O monitoramento e os diagnósticos detalhados permitidos por tal plataforma, por um lado evitam o desperdício de recursos, e por outro, tornam a indústria mais eficiente.
Nada muito diferente das três revoluções anteriores, a recordar: durante a primeira revolução industrial, ocorrida no final do século 18, um enorme salto tecnológico colocou a produção manual na berlinda, substituída implacavelmente pela força mecânica das grandes máquinas a vapor que movimentaram a indústria têxtil no Reino Unido e, posteriormente, no mundo todo; a segunda revolução industrial, já no século 20, foi movida pela introdução da eletricidade nas linhas de montagem, propiciando a produção em massa. A invenção do telefone também foi ponto alto nessa revolução, a qual permitiu as pessoas se comunicarem de forma mais eficiente; já a terceira e mais recente revolução industrial, iniciada nos anos de 1970, estimulou a substituição da tecnologia analógica pela tecnologia digital. A invenção dos computadores permitiu enormes ganhos de produtividade e cunhou o famoso termo “Era da Informação”.
Contabilidade positiva
Não há dúvidas de que as revoluções industriais transformaram nossas vidas. Para se ter ideia, até meados dos anos de 1800 foram gastos cerca de oito séculos para se dobrar o faturamento per capita. A partir daí foi necessário somente um século e meio para que tal faturamento crescesse ao menos 13 vezes.
Saímos de uma era em que a estrutura básica das relações sociais e comerciais situava-se no campo ou em pequenas vilas, para um cenário de alta urbanização. Do foco na agricultura, capitaneada pela força humana e animal, chegamos à indústria enxuta e robotizada de alto desempenho. O homem artesão deu lugar às máquinas de alta produção. A tecnologia promoveu a facilidade de acesso a novos meios de locomoção e comunicação. Também possibilitou a criação de novos medicamentos, os quais permitiram ao homem viver muito mais. As cidades se tornaram maiores e mais complexas. O mundo do conhecimento se abriu aos olhos míopes da era pré-revolucionária, em um caminho de mão única e sem precedentes. Na verdade, o mundo ficou bem menor.
Tudo indica que a linha cronológica das revoluções industriais levou à humanidade ao caminho do progresso. Mas, seria mesmo um progresso?
Nem tudo são flores
Em seu livro Sapiens – Uma breve história da humanidade, o historiador Yuval Noah Harari descreve a revolução agrícola como a maior fraude do mundo. Confesso que fiquei surpreso ao tomar contato com essa ideia, e tive de desconstruir o meu pensamento para entender o dele.
Não vou aqui apresentar em detalhes ou defender a tese de Harari (sugiro aos leitores que passem os olhos por seu livro), mas, de uma maneira geral ele argumenta que até por volta de 10 mil anos atrás o Homo sapiens vivia tranquila e confortavelmente uma vida de caçador-coletor, quando começou a se dedicar ao cultivo do trigo. Em poucos milênios, diz Harari, os humanos estavam fazendo não muito mais do que cuidar das plantações do amanhecer ao entardecer: como o trigo não gostava de conviver com as rochas, o homem foi obrigado a limpar os campos; como o trigo não gostava de dividir espaço, água e nutrientes, o homem precisou trabalhar longas jornadas eliminando ervas daninhas; como o trigo poderia ser atacado por vermes, gafanhotos, coelhos, e pragas, o homem precisou vigiar os campos constantemente; o homem precisou coletar fezes para adubar o trigo, precisou carregar baldes pesados dos poços para matar a sede do trigo; por fim, o homem se tornou um completo escravo do trigo. E o que o trigo deu em troca: uma dieta pobre em vitaminas e sais minerais, difícil de digerir e péssima para os dentes e as gengivas.
O progresso tecnológico, verdade?
Como Harari em relação à revolução agrícola, muitos julgam o progresso perpetrado pelas ondas revolucionárias apenas como mais um engodo. A começar pela excessiva urbanização, à qual levou o homem a viver sob condições sub-humanas na busca infindável de seu sustento; a ingerir uma variedade de produtos processados que de longe poderiam ser chamados de alimentos; e a conviver em um ambiente venenoso que tem se degradado rapidamente, resultado das próprias ações do homem. Difícil dizer que isso é de fato um progresso, não?
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Leia mais na edição nº 10207, de 30 de novembro e 1 de dezembro de 2017.