O que é personalidade?

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Marcelo Bosch Benetti dos Santos

A personalidade pode ser definida, em linhas gerais, como o modo habitual de uma pessoa se comportar em diferentes situações. É a maneira usual como cada um de nós percebe a realidade e a si mesmo, juntamente com um padrão bem estabelecido de pensar, sentir, agir e falar.
Nesse sentido, a personalidade é psíquica e corpórea; corresponde aos comportamentos públicos e privados de um indivíduo, ou seja, aqueles comportamentos passíveis de observação (a fala, os gestos e o andar característicos, movimentos faciais, postura corporal) e aqueles que ocorrem no mais íntimo de cada pessoa, como as ideias, os pensamentos, as imagens, as fantasias, os sentimentos.
Apesar de aspectos constitucionais (ou genéticos) colaborarem na formação da personalidade, ela não é inata. Fatores psicológicos e ambientais são importantes para sua determinação, como experiências infantis e impressões recebidas nos primeiros anos de vida. Elas ocorrem no interior de um ambiente familiar repleto de valores e expectativas, que povoam a trama de relações estabelecidas entre a criança e seus pais, a partir dos quais ocorrem as primeiras identificações.
Assim, podemos conceber a personalidade como sendo multideterminada, o resultado final de uma interação complexa de fatores biopsicossociais, indissociados que estão a determinados contextos culturais e históricos.
Quando se fala em “transtornos de personalidade” (TP) leva-se em consideração, do ponto de vista psiquiátrico ou psicopatológico, os seguintes aspectos: (1) a presença de condutas marcantemente inapropriadas (mal adaptadas) para as mais diferentes situações pessoais e sociais – condutas relacionadas à experiência e demonstração de afetos (afetividade), ao controle dos impulsos, modos de percepção de si e da realidade, ao pensamento e ao relacionamento interpessoal; (2) atitudes disfuncionais que usualmente se iniciam na infância ou adolescência e perduram na idade adulta, independentemente da presença de transtornos mentais e que não podem ser atribuídas aos efeitos de alguma substância ou de qualquer condição médica; (3) a produção de sofrimento e angústia pessoal importantes, apesar de não ser incomum surgirem tardiamente do início do transtorno.
É comum que diferentes alterações patológicas da personalidade compartilhem características semelhantes, o que faz com que estes transtornos sejam divididos em três grandes grupos. Assim, temos: no agrupamento A, alterações da personalidade caracterizadas por excentricidade, desconfiança e pouco interesse pelo contato social – correspondem aos TP paranoide, esquizoide e esquizotípica; o agrupamento B, composto por personalidades marcantemente impulsivas, emocionalmente instáveis e ou manipuladoras, correspondendo aos TP antissocial, borderline, histriônica e narcisista; e o agrupamento C, caracterizando os TP como ansiosos, ávidos por controle e que apresentam atitudes de esquiva / evitação – são os TP ansiosa (ou de evitação), obsessivo-compulsiva e dependente.
Pessoas com algum transtorno de personalidade usualmente apresentam habilidades socioemocionais fragilizadas. Assim, adequação, assertividade, limiar de frustração, estratégias para resolução de problemas, adaptação a novas situações, empatia, autoestima, autoimagem e autoconfiança estão geralmente prejudicadas, de maneira a interferir negativamente na qualidade das relações interpessoais e no desempenho ocupacional (no trabalho, nos estudos e em uma vida mais autônoma e independente, por exemplo).
Por fim, vale mencionar que o termo personalidade provém de persona, que por sua vez faz menção às máscaras dos personagens do teatro na Roma antiga. Entretanto, as máscaras da vida real não são tão provisórias ou circunstanciais como ocorre em uma peça teatral. Na vida real, comumente elas se mostram inquebrantáveis e um dos maiores patrimônios que alguém pode ter (ou ser). Isso não quer dizer que elas não possam ser remodeladas ou parcialmente substituídas, e retirá-las, se não for impossível, não é tarefa fácil… Até mesmo porque muitas vezes não se sabe qual máscara se usa, como ela foi parar ali e nem mesmo para quem devolvê-la.
(Colaboração de Marcelo Bosch Benetti dos Santos, Psicólogo, especialista em Psicologia Clínica, mestrando em Psicologia Clínica – PUC-SP).

Publicado  na edição nº 9877, dos dias 13 e 14 de agosto de 2015.