A saga da exploração espacial em Marte completa 40 anos neste 2014, recheada de muito sucesso, insucesso, frustrações e esperanças. Tudo começou com as missões Mariner em 1964, quando a NASA obteve as primeiras imagens de um sobrevoo da Mariner 4, as quais revelavam um planeta estéril, sem grandes transformações. Embora a qualidade das imagens, comparadas às missões atuais, era deficitária, o conjunto tecnológico da missão representou um avanço científico formidável. Lembro que Marte está a 60 milhões de quilômetros da Terra (maior aproximação), e dirigir uma nave na órbita de um planeta remotamente a esta distância não é algo trivial.
Após a sequência de missões de sobrevoo vieram as missões de pouso e reconhecimento, caso das Vickings 1 e 2 na segunda metade da década de 1970, que permitiram formar a maior base de conhecimento sobre o planeta entre 1990 e 2000, embora sem revelar quaisquer vestígios de vida.
Ainda ao final da década de 1990, Marte recebeu o primeiro jipe (rover) a circular pela sua superfície, o famoso Sojourner, pequeno veículo de seis rodas cujo principal objetivo era estudar com mais detalhes a geologia do planeta.
Marte no século 21
A exploração de Marte no século 21 foi aberta com grandes expectativas pelas missões orbitadoras Mars Odissey (2001) e Mars Express (2003) que detectaram vestígios de gelo na superfície do planeta. Do gelo para a água e da água para a vida é só um pulinho, daí as grandes esperanças.
Em 2004 chegaram a Marte novos jipes para exploração geológica, desta vez, equipados com sofisticados laboratórios para estudo microbiológico do solo do planeta. O Spirit aterrissou em 4 de janeiro, especificamente na Cratera Gusev, rodou por cerca de 8 km, enviou 128 mil imagens e parou de funcionar em 2010. Já o Opportunity aterrissou em 25 de janeiro em Meridiani Planum, rodou 39 km, enviou 187 mil imagens e ainda está em pleno funcionamento (o projeto original de ambos os jipes previa missões de apenas três meses).
Em função de sua longevidade, o Opportunity tem realizado descobertas interessantes para a ciência. A última, que aconteceu em janeiro desse ano, foi de sinais de uma lama antiga feita de água doce em uma cratera chamada Endeuvour, local que já abrigou, há bilhões de anos, um mar salgado e extremamente ácido. Como é difícil prever quando o equipamento deixará de funcionar, é difícil prever também o que mais ele poderá descobrir naquele planeta.
Ainda em anos recentes, Marte recebeu a missão Phoenix (2008), que encontrou gelo em seu solo perto do pólo norte, e a missão Curiosity (2012), preparada para identificar sinais de química orgânica no planeta.
Visões do futuro
Até 2020 estão previstas várias missões ao planeta vermelho, algumas já nomeadas (InSight e ExoMars) e outras ainda somente na imaginação, tanto para revirar a superfície de Marte, bem como para estudar o seu interior.
Se o prezado leitor estiver se indagando pelos motivos de tanta curiosidade do homem em relação a Marte, feito que lhe tem custado bilhões de dólares ao logo desses últimos 40 anos, aqui vão três justificativas básicas: entender a possível grande mudança climática sofrida por Marte em sua história e extrapolá-la para o cenário terrestre; conhecer os seus recursos naturais para possível aproveitamento; e, mais importante de todas, saber se houve ou há vida naquele planeta.
A questão da vida evidentemente estimula questões mais profundas, as quais têm povoado o imaginário humano desde sempre, como “de onde viemos?” ou “somos únicos no Universo?”. Até que consigamos respostas coerentes e confiáveis dificilmente iremos frear o nosso ímpeto explorador, custe o que custar. E isso ainda não tem data de expiração.
Publicado na edição nº 9666, dos dias 6 e 7 de março de 2014.