
Completa-se em 2014, 42 anos da criação de umas das canções mais fortes da MPB.
“Como é difícil acordar calado, se na calada da noite eu me dano. Quero lançar um grito desumano, que é uma maneira de ser escutado..”
Semana Santa de 1973, Gilberto Gil e Chico Buarque reunidos em um apartamento, a pedido da Gravadora Polygram, para comporem em parceria. No poder estava Garrastazu Médici, o mais violento de todos os generais na presidência, que liberou os aparelhos de repressão, tortura e censura.
Como era de costume, Chico levou bebida para tomar com Gil. Era Sexta-feira Santa, ambos de formação católica, imediatamente perceberam a ambiguidade da frase Cálice, que remete a “Cale-se”. Assim nasceu a canção, com quatro estrofes, todas em oito decassílabos.
Em maio daquele ano, para o Show Phono, subiu a dupla no palco, totalmente contrariada com a informação de que estariam proibidos de cantar a música, porque a letra havia sido censurada. Em protesto, tocaram a melodia, com versos desconexos. Há ainda a lenda de que o receio de represálias fez com que os produtores do show, cortassem o som na hora da execução da música.
Em 1978, finalmente, já durante o governo Geisel, o general da Anistia, Chico Buarque consegue gravar a canção, não sem polêmica. A direção da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) adotou a música como forma de protesto à truculência dos governos da América Latina. No mesmo período, também havia ditaduras militares na Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai.
No período em que vivemos, em que até meu filho de 9 anos, sabe decor os versos de “Beijinho no Ombro”, recordo-me que escutei Cálice, aos 8 anos, na Rádio Diário FM, no carro de meu primo Jorginho, funcionário do Banco do Brasil. Ao perguntar o que queria dizer a letra, tive minha primeira aula de História do Brasil.